Sultanato de frustração e talento.

              Referência do Fenerbahçe, Alex virou uma estátua produzida por um torcedor do clube turco. Neste sábado, o brasileiro esteve na solenidade de inauguração da homenagem. O meia agradeceu e se emocionou ao falar sobre sua história no time. No discurso, ao lado dos filhos e da esposa, Alex chorou e questionou se merecia tamanho reconhecimento. O brasileiro é o segundo maior artilheiro do clube na liga local, com 136 gols em 242 partidas.

Riqueza, poder e adoração. Em uma época marcada por angústia e alienação surge por entre as linhas divisórias do Egeu e do Mediterrâneo um suntuoso império. Magnificência dominada por soberanos que traduziam tais palavras de encantamento, os famosos sultões. Homens soberbos e detentores de enorme aparato. A opulência dos palácios e das portas sublimes era inalcançável para os vassalos. Idade de trevas e governantes taciturnos. Não haveria vozes que acalentassem as dores existenciais do povo. Pairava um silêncio empedernido e questionador. Onde estão os nossos heróis? Do Futebol viria a redenção dos lastimosos.

Coube a um mero paladino dos campos virentes a honra máxima de uma nação. Graça essa que nem mesmo Murad  e Osman, mártires otomanos, foram contemplados: a dádiva indelével do mármore.

Ele não queria! Mas embora contra a vontade, aceitou com a condição do pranto. A vital contradição entre a pedra e o homem. As estátuas não choram, não sofrem, não vivem. São incapazes de padecer das mágoas. São moldadas por mãos graciosas, assim como as águas que definem o imenso oceano também modelam as nuvens, que também derrama lágrimas. A vida que o artista criou é infinita como o pó. Eis aqui a obra final do ser humano: as estátuas não morrem. Carregarão eternamente a figura melancólica de um certo Alex.

Um jogador que sempre viveu na fronteira intervalada da apatia e do entusiasmo. Um perfeito paradoxo. Para os seus detratores, ele não passava de um indolente; o mais inerte dos seres. Para os admiradores, é um gênio adormecido; uma fera acuada pronta para mostrar as garras. Um nômade por caminhos do regozijo e do desalento.

Os nostálgicos os saudavam como sendo o último dos românticos. Uma combinação esmerada entre clássico e moderno. Primor que remetia aos meias do passado, aqueles mesmos que passavam meses sem errar um passe. A bola é a sua conselheira, o seu gran vizir; a mais fiel das companheiras. Toques, jogadas, gols de placa... Lances e meneios rubricados com o louvor do mais talentoso dos artistas bizantinos.

A nobreza sempre foi digna em tua essência, Alex. Fostes uma pérola no meio dos porcos. Tingisse com uma mancha verde os corações esperançosos de uma torcida carente e apaixonada. Coroado triplamente por uma corrente azul e impetuosa. Líder de um exército de raposas quê triunfou sob as alterosas. Infelizmente, mesmo coberto de glórias e saudações, ainda é portador de uma ferida na alma: o brilho cintilante da amarelinha jamais refletiu em seu peito.

                Trêmulo de indignação perante o infortúnio e sôfrego por um desejo insaciável. A miséria da injustiça! Vítima da casualidade e de um antigo mestre, o responsável pela maior decepção de sua carreira: a satisfação de uma Copa do Mundo. Amargurado, encontraria refúgio na nova Constantinopla, não aquela das agruras, onde imperava o som da morte. Acharia em terras distantes o mais caloroso e ensandecido dos brados aficionados. Enfim viria o reconhecimento...

                O Alex agora é soberano de uma nova terra. Dono de um mundo que vê como seu. Um colosso nos olhares afáveis dos súditos. Quatro mares de mistérios e magia banham a sua nova morada. A península da Anatólia, por onde andaram reis e desbravadores, agora é solo para um virtuoso tupiniquim. A lua e a estrela fulgurantes no pendão vermelho alvejaram as máculas de seu espírito. Finalmente a frustração sucumbiu perante a glória. Pode não ser um califa de antanho, considera-te, porém, o ídolo maior dos abastados. Saudemos o novo sultão.

POR: Otávio Camilo