segunda-feira, 27 de agosto de 2012

O milésimo gracejo de um artista


              Um dos maiores ídolos da história do Botafogo, o atacante Túlio Maravilha será apresentado pelo clube nesta segunda-feira na sede de General Severiano. A volta do jogador, de 43 anos, faz parte do projeto do seu milésimo gol. Pelas contas do jogador, ele tem 993 tentos. A estréia ainda não foi definida.
Conhecemos um homem pelo seu sorriso. Sensação que embeleza, que encanta, suaviza. Até mesmo o mais insensível dos seres já sentiu a alegria derramar de seus olhos tempestuosos. Vivemos em um mundo de melancolia, no deserto da sisudez insana, onde o oásis do encantamento se esconde por entre as dunas da incompreensão humana. E quem de nós seria capaz de encontrar essa terra fértil no meio do nada?
O sorriso é o manjar que alimenta o espírito; a energia que dá força à vida. Orelhas grosseiras, corações amargurados; no máximo nos debruçamos sobre um rir filosófico, aquele mesmo que Machado de Assis descreveu tão bem: uma satisfação duvidosa, acanhada. Quando deixamos de ser felizes?
No Futebol, assim como na vida, a alegria foi se pondo como o sol em dia de chuva. Um desvanecer cruel e minucioso. O capitalismo desenfreado transformou a nossa paixão em um negócio; nossos heróis converteram-se em máquinas, e até as comemorações irreverentes foram banidas. O lúdico se fez maçante, e o espalhafato se perdeu como poeira no tempo. Em meio a soldados robotizados, ainda resiste com bravura o último dos intrépidos; uma fagulha de romantismo numa luta tenaz contra o império da tristeza. Eis uma maravilha...
Nunca houve um jogador como o Túlio. Nos erros e nos acertos; nas alfinetadas e nos gols de placa, era sempre diferenciado. Polêmico, falastrão, bravateador... E daí? O que seria dos gramados sem um pouco de fanfarronice? Era daqueles raros personagens que despertavam o ódio e o fascínio exatamente na mesma proporção. Fez da grande área o seu reduto, seu feudo. Atacante frio, matador impiedoso, sua alma, porém, era a de um menino zombeteiro. Era feliz, porque o mundo para ele não lhe tinha mágoa.
Ah Túlio, fostes único, assim como a estrela solitária do clube que o glorificou. Um amor em preto e branco. Cantastes um soneto em homenagem aos abnegados. Era uma chama que ardia e inflamava os aficionados; um símbolo de ostentação para os incompreendidos. O júbilo do fogo.
Sua expressão ressaltava um compêndio de trivialidade e presunção. Rei dos chistes e das falácias. Era o palhaço dos campos; fazia das quatro linhas o seu picadeiro, e seu sorriso contagiava a todos nós. Era uma fina flor fincada num pântano de agonia.  
Foi o grande Don Juan dos boleiros. Vestiu mais de 20 camisas e fez juras de amor a todas elas. Traidor e amante inveterado. Por fim, só dedicou amor a uma bandeira... E para lá voltará mais uma vez. Túlio foi uma obra satírica; uma comédia, um romance. Uma dramaturgia de Moliére.
Gol de impedimento saudado com louvor, gol de mão, de calcanhar. Uma provocação aqui, um gracejo ali... Era um Deus entre os normais. Usou a 7 de um certo Mané, e foi contemplado como uma verdadeira enciclopédia. Um livro bem escrito do bom humor.
Punhado de ilusões; mentiras que ouvimos quando os ventos nos trazem. Os detratores contestarão esses números; os fãs farão contagem regressiva. Talvez não sejam mil, como não foram os do Romário, mas que sejam 800, 900... Não importa! Saudemos aquele que nos encantou com a sublime arte do rir. Aplausos para o milésimo gracejo de um artista.




2 comentários:

  1. A rivalidade e as provocações não são mais como antes, relembrar essa época assim como ver um jogador que sempre fez sua função parecer fácil não têm preço. Ele merece todas as honrarias e saudações de um time que joga por muitas vezes bem, mais que não costuma converter em gols na mesma proporção.

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  2. Amigo é com grande orgulho que venho escrever nesse espaço.Pimeiro gostaria de dizer que este texto ficou perfeito e que tal perfeição tocou na minha alma de esportista e de fan do verdadeiro futebol arte. Tulio foi e é único alegrou toda uma nação e criou sem perceber uma legião de torcedores do verdadeiro futebol brasileiro.Sendo assim posso apenas parabenizar pelo belo texto e que possa haver outro quando chegar aos mil.

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