sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

A despedida do fabuloso


          
            O São Paulo conquistou nesta quarta-feira, dia 12, o título da Copa Sul-Americana de forma inesperada. No intervalo da partida no estádio do Morumbi, com o time brasileiro vencendo por 2 a 0, gols de Lucas e Osvaldo, o time argentino do Tigre não voltou ao campo. Depois de mais de 30 minutos de muita confusão, indefinição e conversas entre dirigentes, o árbitro chileno Enrique Osses apitou o final do jogo mesmo sem a presença dos argentinos.
           Apesar do clima desfavorável, os jogadores são-paulinos, no gramado, puderam então comemorar a inédita taça da competição continental, acompanhados dos 67 mil torcedores presentes no Morumbi, encerrando um jejum de quatro anos sem troféus. O São Paulo não faturava um título desde a conquista do Campeonato Brasileiro de 2008. A final desta quarta coroou a despedida de Lucas, negociado com o Paris Saint-Germain da França.
Antes de escrever qualquer linha de homenagem, é preciso analisar essa final com o pragmatismo que se exige nessas circunstâncias. O São Paulo entrou em campo como grande favorito e combateria um inimigo que, da longevidade de sua história, jamais obteve sucesso nos âmbitos doméstico e continental. Uma equipe minúscula, que se propôs a praticar um futebol completamente ultrapassado; utilizou-se da pancadaria e de uma tola malandragem. O Tigre jamais se portou como o portentoso e feroz animal que lhe concede o nome, e nem de longe conseguiu representar com o mínimo de honradez a grande escola da qual pertence. Um país que revelou Di Stefano, Maradonna e Messi merecia um clube a altura de suas tradições para enfrentar a forte equipe brasileira. Título mais do que merecido, apesar de um oponente de baixíssimo nível técnico. Não aviltarei mais essa crônica ao ressaltar a pequenez. Destacarei a melhor parte de uma saga predestinada ao sucesso: o adeus de um jovem fulgurante.
Quão triste pode ser uma despedida. Não queremos dizer adeus, nem por breves momentos. Quanto sofrimento é revelado por meio de gestos e dizeres. A separação maltrata, dilacera; tudo em sua essência transforma-se em lamento, pranto e drama. A angústia pela distância que se apresenta, pela partida desalentada. É o esquecimento absoluto ou quem sabe uma melancólica nostalgia. Olhares macambúzios, desilusões, sonhos acabados; a renúncia a um mundo que pensava ter. Uma palavra pronunciada com a voz rouca, um meneio oferecido com as mãos trêmulas. Uma fala fugaz e balbuciada com a mensagem de até logo. Seria esse o desfecho de uma noite gloriosa?
A despedida poética nem sempre se converte na veracidade dos fatos. O que vimos ontem no Morumbi foi à plena felicidade da conquista, apesar dela ter sido maculada pelo tom saudoso das arquibancadas e pela brutalidade dos adversários. Um título ofuscado por personagens que deveriam permanecer à margem do espetáculo, mas exaltado através dos pés prodigiosos de um futuro soberano da bola. Eis um talento fabuloso...
Um maestro e o seu concerto de louvores e aclamações. O craque que ainda desfruta da lepidez da mocidade. Um gigante de 1.65 com a coragem necessária para superar a sordidez inóspita dos algozes argentinos. Encarou a insignificância e a violência com a sobriedade digna dos virtuosos. Em nenhum espaço de tempo se deixou abalar pelas intimidações, nem tentou revidar a selvageria e as faltas que lhe foram impostas, pelo contrário, permaneceu sereno e elevou-se perante os seus caçadores. A habilidade superou o primitivismo.
A calma e a engenhosidade nunca lhe foram tão propícios; a velha e repisada catimba dos Hermanos em nada significou diante de Lucas. Para, ginga, dribla, inebria... Lá vai ele, varando no seu vôo de asas cegas, rompendo os limites e cortando o vento. Nunca cessa, passa incólume pelos mais difíceis obstáculos. É rápido como uma flecha em direção ao seu alvo; célere e devastador como a força inabalável de um furacão. 
Os catedráticos do futebol designaram a mais adequada das alcunhas, erraram, porém, na escolha do homenageado. Denominação que remete às lembranças jubilosas e instantes fantasiosos de contentamento. Na memória dos tricolores não restará espaço para os rompantes de um certo artilheiro, que do alto de sua referida experiência ainda não aprendeu a conter os seus ímpetos de fúria. A saudade e as recordações serão dedicadas a um jovem de sorriso humilde e encantador, de hábitos singelos e sem distinção. Dedicaremos os nossos aplausos ao dono de uma arte quase pueril, mas com o espírito que consegue despertar a admiração até dos mais experimentados.
Em seu lacônico discurso, não pôde encobrir o abatimento profundo que o minava; seus olhos estavam rasos de lágrimas e podia-se ler neles o regozijo de sua alma, o seu nariz era pálido e sonolento de saciedade e a sua voz era de uma ternura que amolecia até os mais empedernidos. Uma expressão satisfeita e condigna. Sentiu cócegas de ficar, de brilhar mais uma vez no palco que o acolheu com carinho, mas seria impossível. Enfim os aficionados tricolores acharam a ocasião propícia para cantar uma saudade, e esse sentimento dói tanto como aquele da desunião. O nosso nobre paladino seguirá a passos firmes por aquela estrada que leva os fortes à glória, e de lá só retornará no ocaso de sua carreira. Para nós, meros contempladores do seu talento, só caberá à espera do regresso e talvez uma fala fanhosa e saudosa expressando um afetuoso recado: obrigado, Lucas!

POR: Otávio Camilo

Um comentário:

  1. Cara, até gostei. Mas pelo título da matéria deu a se entender que se tratava do Luis Fabiano.

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