terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

A ascensão dos canalhas


             Há atitudes que melhor se dizem calando, mas seria muito fácil prostrar-me sob a sombra do silêncio indignado ou da indignação. Algumas coisas são eternas como as pedras fincadas no chão; perpétuas como a epopeia de tristeza de um bravo povaréu. Que venham as obviedades...
Pobre povo nordestino! Poderia vocês identificar nessa proemiar frase uma exaltação da síndrome coitadista que permeia o pensamento de toda uma região, ou uma lamentação cretina de mais um desses filósofos da calamidade. A miséria que nos aflige vai muito além de um solo árido, do sol totalitário, das retiradas da fome, dos braços rijos empunhando uma enxada ou de uma mãe que pranteia a perda de um filho. Em nossa essência permanece gravada uma carcoma indelével, e que já faz parte da nossa vasta cultura. A terra mais bonita e amável do mundo; as noites aconchegantes e macias, o céu bordado de estrelas, a voz maviosa dos cantadores e as palavras infinitas dos nossos literatos. Imensuráveis são os nossos encantos; perene é a nossa santa ingenuidade. A beleza dos cenários nos enche de orgulho e cativa os olhares externos, mas a antítese do conhecimento é o que nos distingue, e a ela devemos os piores flagelos: a política e seus partícipes.
Os carentes e ignaros eleitores das pequenas cidades nordestinas ainda padecem das práticas rançosas do passado. Subjugados, manipulados e subornados pelos coronéis modernos. Homens e mulheres que garantem a subsistência através de favores e objetivos espúrios, subordinados as imposições de tais politiqueiros. O voto de cabresto é mais antigo do que a própria tolice, e ele será infindável tal qual a ignomínia. É diante desse concerto sinfônico dos “encabrestados”, que surgem os mais engenhosos maestros. Indivíduos que emergiram do mar eterno da corrupção e pautaram suas vidas públicas sob a ótica medonha desse vil costume. O palco sagrado dos discursos de Rui Barbosa nunca fora tão molestado. A casa que guarda a democracia foi transformada em um mortal pântano de prevaricação, em que apodrece e morre tantas vezes a flor das nossas esperanças. 
                Na última semana, dois nordestinos foram designados aos postos mais elevados do Congresso Nacional. O que para mim poderia representar uma espécie de orgulho regionalista, não foi além de uma torrente de angústias e frustrações. Homens que postam-se sempre como um daqueles pomos, que exibem na superfície a mais fresca e viçosa honestidade, e que entretanto trazem no âmago o germe da sordidez. Um deles, norte-rio-grandense como o jornalista que vos fala, aproveitou-se dos benefícios do poder oligárquico de sua família, e há mais de 40 anos fez do seu ofício de arauto da servidão o mais vantajoso dos encargos. Fez da política uma profissão. O outro, nascido na terra dos marechais, foi aliado fiel daquele a quem todos baniram da Presidência da República. Recentemente, ainda no comando do Senado, protagonizou um escândalo denominado de “renangate”, em alusão ao famoso caso americano. Empresas fantasmas, laranjas, empreiteiras, tráfico de influência... Acima de tudo isso soa o eco vago e surdo desta interrogação: seremos testemunhas de um drama ou de uma comédia?
               Caberia a mim a mais profética das evidências, se afirmasse que ficaríamos sorrindo como em um imenso picadeiro, daquele gracejo oblíquo dos maus. A cidade onde reina o esplêndido astro-rei e seus ardentes raios dourados merecia regentes melhores do que esses que ostentam o sobrenome Alves. Assim como a estrela radiosa das Alagoas seria mais imaculada sem a malícia habilidosa dos Calheiros. As opressões do passado ainda são vivas em nossas mentes, e os personagens capeados de dissimulação e duplicidade ainda nos governam. Até quando?
               A direta ingenuidade dos puros estabeleceu uma perene aliança com a hipocrisia paciente e sistemática dos falsos políticos. Sentados no trono da igualdade, Renan e Henrique estarão se deleitando mediante um riso interior, que é o mais voluntário, cruel e também o menos arriscado que poderíamos dar às vaidades humanas. “Enganaremos os tolos mais uma vez”. É assim que pensam.
              Malditos sejam vocês, canalhas! Corja que se ufanam da inconsequência de milhares; amontoado de sanguessugas de sede ilimitada; escória danosa que se negam a atender aos apelos das vozes roucas das ruas. Mancharam o seio da nossa democracia com as cores negras da desgraça. E nós, vítimas da perfídia dos poderosos, abandonamos velhos hábitos, mas trouxemos intacta aquela citada ingenuidade. A onda da vida nos trouxe à mesma praia, e nela continuaremos a roer o pão da solitude moral. Renan Calheiros e Henrique Eduardo Alves, ascendam e caiam, do mesmo modo que os fétidos frutos despencarão dos galhos da mais formosa das árvores. Saudemos a vergonha do Brasil!
                                                      
Otávio Camilo

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