quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Um lance de ilusão


             Imbatível durante sete anos na Volta da França, o americano Lance Armstrong, que chegou a ser considerado uma lenda do ciclismo, teve sua imagem manchada para sempre por ter montado um sofisticado esquema de doping, e perdeu oficialmente, nesta semana, os títulos alcançados de 1999 a 2005. Essa decisão pode acabar de vez com o mito do atleta que para muitos representa um exemplo de superação por voltar a competir em alto nível depois de um câncer em 1996.
O ser humano e o seu pérfido desígnio. Saciamos os nossos sentidos inebriando a dura realidade através de um sonho, de uma miragem. As inúmeras tragédias e misérias da nossa alma são reveladas mediante a naturalidade sórdida de um ato: a mentira. Vede um princípio mais velho do que a morte e perpétuo como o firmamento. Até mesmo os primeiros homens que vagaram por esse mundo foram aturdidos pelo desejo indigno de tal prática. A mais edificante e doce das palavras quando se é proferida; mas, ao ser descoberta, poderá converter-se na mais cruel das calamidades. Pois bem, caros leitores, a distância que separa a fantasia da veracidade é medida por meio da singeleza de um pensamento. O real transformou-se em ludíbrio através de pés prodigiosos que estavam sobre os pedais de uma mera bicicleta. Eis o mais vil dos atletas...


Como és bela, Paris... Pudera haver outras como tu. Os dias ensolarados e camuflados acompanham o teu romantismo. Tudo é airoso, magnificente e aprazível aos olhos que buscam a autenticidade. Todavia, os sentimentos dos seus apreciadores  foram traídos por uma farsa. O tradicionalismo do seu grande laço foi vilipendiado por um daqueles monumentos eternizados pelo orgulho. A Torre Eiffel e o Arco do Triunfo foram fiéis testemunhas da deslealdade do mais portentoso dos seres. Armstrong, maldito seja o teu nome!
As tendências do espírito e os cálculos da vida. Assim como o seu homônimo, aquele que nos revelou a resplandecência inalcançável de uma enganação, ousaste  lograr a todos com a sua suposta engenhosidade. Embaiu por intermédio de uma hipotética perfeição. Tentemos nos lembrar de um ídolo. Chamaria de devaneio...   
Um príncipe, um rei, um mito... Assim fostes elevado. Inspirado pelo formoso cenário circundante, e por aquela terra fértil de onde brotam guerreiros que lutam pelos seus ideais, Lance Armstrong tornou-se o soberano daquelas montanhas suntuosas. Possuía milhares de súditos; embevecidos ficavam ao contemplar o esforço sobre-humano de um homem que superou as máculas que o destino lhe impôs. Entretanto, a vitória seria para ele o máximo dos infortúnios.

Como você foi digno de admiração, Lance Armstrong. Só era necessário pedalar para que causasse tamanha comoção entre as pessoas. Sorria de alegria na mais escarpada das subidas e mais a mercê dos ventos. Cortava o tempo, rompia os limites tempestuosos. Sentado na sua sela, sentia a brisa fagueira e descrevia esmeradamente o seu congraçamento com a natureza. Sem o louvor dos vassalos, as ruas já não estarão tão calorosas; e, talvez, os campos da cidade luz tenham perdido um pouco do verde de outrora. Todas as esperanças e ilusões sumiram ao descerem por um declive de floridas conjecturas. Aquele poeta montado em uma máquina de duas rodas já não existe mais.    
Lance Armstrong repetiu uma mentira sete vezes e ela transformou-se na mais irrefutável das verdades. Ocultou a sua face de maneira desprezível. O empenho, as conquistas, as glórias... Para ele foram dedicadas todas as honrarias de um esporte, mas que irão se esboroar tal qual um castelo de cartas desaba perante uma forte ventania. Serão apagadas ao caírem naquele enorme abismo que leva à ilusão. Será um novo Bem Johnson, provavelmente. O ostracismo te espera.  

POR: Otávio Camilo                                                                                       

Um comentário:

  1. Ele não foi o pioneiro, não foi o único nem será o último, se tivesse parado antes de ser pego teria sido imortalizado como muitos outros ídolos. Assim como ele, muitos o seguem e fazem o mesmo com a esperança de nunca serem pegos. Essa prática existe em quase todos os esportes, já vem de muitas décadas, o esporte está cada vez mais mecânico, robótico. A pressão por parte dos patrocinadores fica cada vez maior, forçam alguns atletas a cometerem esse erro que, por muitas vezes fica a menção de que "o crime compensa", nesse caso, o sucesso e o fracasso andam de mãos dadas na vida de cada atleta.

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